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Posts Tagged ‘abertura; haneke; bergman’

Para bem ou mal, certas coisas nunca mudam.

O FIC Brasília já está em sua décima primeira edição e assim como a própria Academia de Tênis, costuma primar pelo amadorismo. Um mau amadorismo, freqüentemente.

A concorrida noite de abertura do Festival ocorreu na quarta, dia 4 de novembro. Depois do coquetel mal-servido, a cerimônia começou com quinze minutos de atraso. O que é normal em Brasília. Quando não se atrasa demasiado, começa-se antes do previsto – como acontece há alguns anos no CCBB. O bom senso sugeriria cinco minutos de tolerância; nada mais, nada menos.

Mas voltando ao que interessa, mal começara a cerimônia de abertura do FIC e parecia que ela não acabaria jamais, de tão entediante. Boa parte da culpa cabe aos apresentadores Orã Figueiredo e Renata Caldas, atores que comandaram a cerimônia de encerramento no ano passado e uma dupla pra lá de sem graça.

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Quem também continua o mesmo, felizmente, é o bom e velho Michael Haneke, que choca o espectador para convidá-lo a refletir. Seu novo filme chama-se A Fita branca (Das weiße Band: Eine deutsche Kindergeschichte, 2009), vencedor da Palma de Ouro em Cannes.

Filmada em preto e branco, a estória é narrada como mito e alegoria. Um pequeno vilarejo no norte da Alemanha se torna palco de estranhos crimes, aparentemente punitivos, pouco antes da I Guerra Mundial. Os acontecimentos não são anomalias, pois estão diretamente relacionados à natureza da aldeia, comandada com mão de ferro pelo Barão ao lado de outras autoridades, como o Pastor e o Administrador. Os relacionamentos, rigidamente hierárquicos, são baseados no medo e na desconfiança. As crianças, tratadas com brutalidade, comportam-se de maneira anormal. A fita branca do título é amarrada nos pequenos justamente para demonstrar que não são dignos de confiança. E o subtítulo, “uma história infantil alemã”, é ironicamente apropriado. O que se vê na tela é uma sociedade opressiva e perversa, semelhante em alguns aspectos a algumas das primeiras colônias inglesas na América do Norte. Em poucas palavras, Haneke criou um microcosmo da crueldade.

Dirige o filme com seu estilo caracteristicamente seco e austero. Por outro lado, nunca havia se apresentado tão claramente como um herdeiro de Bergman. Também lembra aqui outro escandinavo, o Lars von Trier de Dogville.

 A Fita branca pode não ser uma obra-prima (peca, por exemplo, em algumas escolhas narrativas), mas chega perto disso. Constitui uma experiência marcante, que deixa o espectador pensando por muito tempo depois. Chega, inclusive, a sugerir algumas explicações sobre a origem do nazismo. A exemplo do que ocorre com Dogville, porém, seu verdadeiro mérito reside no que o filme revela acerca da natureza humana, e não em supostos insights a respeito de sociedades específicas. Observam-se aqui traços de uma louvável misantropia – muito superior, por exemplo, ao tolo posicionamento político do diretor em Caché (2005), produção que toma partido das hordas bárbaras que invadem a Europa. No fim das contas, é como bem diria o próprio Bergman: o homem tem câncer na alma.

P.S. 1: A Fita branca não será exibido novamente no FIC, mas deve chegar aos cinemas brasileiros em março de 2010.

P.S. 2: Um belo curta-metragem antecedeu a projeção do novo Haneke. Dirigido por Pedro Freire e estrelado por Paulo José e Juliana Carneiro da Cunha, O Teu Sorriso trata de uma paixão entre dois idosos.

– Túlio Sousa Borges, colunista de cinema do Portal Brasil

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